Maio verde

Doença celíaca e os desafios para uma rotina saudável

Restrição ao glúten para estes pacientes é coisa séria e deve ser seguida todos os dias

Foto: QZ7 Filmes - DP - Comprar produtos alimentícios produzidos em padarias ou supermercados que tenham um local separado para produção de alimentos sem glúten é um cuidado importante por causa da contaminação

Por Joana  Bendjouya

Uma doença autoimune, ou seja, as células de defesa imunológica agridem o próprio organismo, causando assim um processo inflamatório. No caso da doença celíaca, a inflamação é provocada pelo glúten, uma proteína presente no trigo, cevada e no centeio. Segundo a gastroenterologista e endoscopista Amanda Medeiros Recuero, esse processo inflamatório, que no caso ocorre na parede interna do intestino delgado, gera a redução da absorção dos nutrientes. “Esta é uma condição que ocorre em pessoas com predisposição genética, em que há uma reação imune do próprio corpo contra o glúten, essa resposta do corpo gera inflamação prejudicando assim a absorção de nutrientes importantes como no caso do ferro”, explica.

Apesar de não ser uma doença rara, essa é uma condição ainda incompreendida, principalmente no Brasil. “Estima-se que 1% da população mundial tem a doença celíaca. Porém, no País, ainda não existe uma estatística oficial que defina o número de celíacos”, enfatiza Amanda. Segundo a Federação Nacional das Associações de Celíacos do Brasil (Fenacelbra), a principal dificuldade está em muitos pacientes não terem o diagnóstico adequado. “Não há cura e, até o momento, o único tratamento possível é a retirada total de alimentos que contenham glúten”, explica a médica.

Algumas pessoas têm um risco aumentado de apresentar doença celíaca, como no caso das que possuem diabetes tipo 1, hipotireoidismo ou Síndrome de Down. Além disso, quem possui na família algum familiar de primeiro grau que já apresente esta condição tem maior risco de desenvolver a doença. “Pessoas, nestes casos, precisam realizar os exames de rastreio que devem ser realizados mesmo que não existam sintomas”, orienta Amanda.

Algumas condições também indicam a necessidade do rastreio da doença celíaca, como alteração de exames do fígado, epilepsia e aftas orais de repetição, infertilidade ou menopausa precoce.

Como é feito o diagnóstico?
A médica relata que algumas vezes o diagnóstico da doença celíaca pode ser bastante desafiador, visto que pode se manifestar de diversas maneiras e em diferentes idades, de crianças a idosos. “Além das manifestações clássicas, existem ainda aqueles pacientes assintomáticos ou que apresentam apenas manifestações extra-intestinais da doença, como infertilidade. O diagnóstico é feito através de uma união de características clínica, exames de sangue e biópsias do intestino delgado realizadas através da endoscopia digestiva alta”, conta Amanda.

Quando se deve restringir o glúten?
É importante destacar que não se deve retirar o glúten da alimentação até a realização dos exames solicitados pelos médicos, pois estes exames só estarão alterados se o paciente ainda estiver fazendo a ingestão do glúten. “Uma vez que se retira o glúten da dieta, há uma chance considerável que estes exames se normalizem, prejudicando assim o diagnóstico. Por isso, se há a suspeita de desordens relacionadas ao glúten, o paciente deve procurar primeiramente o médico gastroenterologista para realizar a investigação; somente após o diagnóstico o glúten deverá ser retirado da dieta”, orienta a médica.

Tratamento
O tratamento consiste na adoção de uma dieta livre de glúten, preferencialmente com acompanhamento e a supervisão de um nutricionista. Essa mudança alimentar vai muito além de simplesmente consumir produtos que não contenham o glúten na sua composição, segundo a médica, é preciso adotar novos hábitos na rotina de preparo para garantir que não haverá contaminação. “Devem ser utilizados utensílios de cozinha e superfícies específicas para preparar os alimentos, prevenindo a contaminação por outros que contenham glúten”, enfatiza Amanda.

Além disso, a médica orienta que deve ser realizado um acompanhamento periodicamente com o médico gastroenterologista para cuidados e prevenção de deficiências nutricionais. “Realizar o rastreio e avaliação da resposta ao tratamento, são alguns cuidados muito importantes”, avalia.

Diagnosticada em 2020 com a doença, Tatiana Rosa conta que na época já conhecia a doença por ter uma amiga convivendo com o problema. Segundo ela, a partir daquele momento, soube que sua vida iria mudar. “Quando recebi o diagnóstico, já sabia que eu teria uma mudança drástica na minha alimentação e costumo dizer que já sabia que teria três grandes inimigos: o glúten, a contaminação cruzada e a questão social”, comenta, lembrando situações em que o convívio social inclui as reuniões e alimentações coletivas que nem sempre têm um cardápio inclusivo ou preparado de forma segura. “Eu não tenho que esperar que as pessoas saibam sobre a doença e as restrições. Muitas vezes as pessoas não têm ideia e acham que podemos comer pelo menos uma quantidade menor, mas eu sempre tento explicar que não posso, que meu organismo não pode ter contato algum com o glúten. Eu percebo que tenho o papel social importante em informar também”, comenta.

Mas, em contrapartida, Tatiana se diz muito tranquila com as possibilidade alimentares, assim como o crescimento da oferta de culinária inclusiva cada vez maior. “Eu gostaria de dizer para quem foi diagnosticado recentemente que não se apavore, que tanto a culinária quanto o interesse nas informações acerca da doença estão crescendo”, reflete.

Dieta livre de glúten pode ser uma opção alimentar mais saudável?
A adoção de uma dieta livre de glúten sem uma necessidade real tem se tornado cada vez mais comum. No entanto, fora de um contexto em que realmente esta dieta é indicada e sem acompanhamento adequado, uma dieta livre de glúten pode ter efeitos opostos a um corpo mais saudável. “Inúmeros estudos demonstram que uma dieta livre de glúten geralmente contém menos grãos integrais e fibras, podendo levar ainda à deficiência de vitamina D, vitamina B12 e minerais. Além disso, pode conter mais açúcar e gordura saturada”, ressalta a médica.

NoGlu- Cucaria e padaria inclusiva

Com um cardápio inclusivo e cheio de sabor e afeto, bolos e pães podem ser encontrados para consumo de pessoas que possuem restrição alimentarFoto: Jô Folha - DP


Além de uma produção própria, “glúten free”, os produtos comercializados na cucaria e padaria respeitam a forma inclusiva e repleta de cuidados que são necessários nesta condição de saúde. “Trabalhamos de forma afetiva e segura, aqui temos como missão estar junto ao nosso público tão singular, no intuito de trocar conhecimentos e abrir um espaço de escuta e contribuição na melhoria do meio social e também alimentar dessas pessoas. Além da restrição do glúten, se essa pessoa tiver outras vamos adaptando a produção para que fique acessível. Se ela não puder açúcar, se não puder leite, temos opções para estes públicos”, explica Valéria Cunha, uma das sócias.

Com este cuidado e olhar carinhoso para as pessoas que possuem restrição alimentar, oferecem assim um cardápio variado onde é possível encontrar produtos que muitas vezes não poderiam fazer parte da sua rotina alimentar pelo motivo de possuir glúten ou ter tido contato com algum produto que o contém, o que é bastante comum em cozinhas que produzem alimentos que não apresentem restrição. “Os nossos produtos são 100% sem glúten. Nossa cozinha é segura, sem perigo de contaminação cruzada. Esta é uma das primeiras coisas que aprendi no mundo da cozinha inclusiva, é muito importante ter cuidado com os itens que utilizo para cozinhar e forma correta de higienização. No entanto, além de sem glúten, nossos produtos são sem lactose, na sua maioria são produzidos com água, e os poucos que usamos leite é a opção sem lactose. Também não usamos açúcar branco refinado”, comenta Jones Pires, chef da NoGlu.

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